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quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Apenas uma nota...

Devido à chapada incompetência do dono da máquina fotográfica em questão, em perceber os tipos de programa que existem para tirar fotos, fica o aviso de que algumas estão com péssima qualidade.

Reclamações é favor dirigir ao proprietário da máquina, na hora do expediente.

Obrigado

Бесконечное путешествие

















quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

The Road to Russia

26 de Dezembro, 18h20

Depois de um Natal, com os seus traços de distinção para outros passados e outros, quiçá, vindouros, o relógio da estação de comboios marca a hora inevitável. Quatro números que marcam um destino, uma escolha, uma responsabildiade, uma acção ditada por acções e omissões de uma viagem planeada com tempo, mas sempre com a sua incerteza pendente devido a um desconhecimento parcial de uma realidade que se pensa poder constatar e confirmar. Confirmação de ideias estereotipadas, de um qualquer país, de uma qualquer nação, que nem mais nem menos é a Mother Russia.

Um comboio com traços de vermelho e branco, uma subida dificil para o compartimento, degraus altos que fazem lembrar um camião TIR. Parado à porta, a segurar uma mala amarela pesada, os seus quase 13kg, vim a saber uns dias depois, com costas a suportar quase 4kg, devido a uma coisinha rectangular preta que uns chamam de "laptop", outros apenas de "portátil". Três revisores, dois homens e uma mulher, inglês mal trocado e bilhetes deixados com eles. Percorremos a carruagem da primeira classe, mais umas quantas dezenas de euros para um compartimento privado com camas e nenhum espaço de movimento interior. Passamos a carruagem-restaurante, a sensação de um conforto não luxuoso mas medianamente simpático e acolhedor. Chegamos à nossa carruagem, 176 Litas para ver um lar de idosos junto à porta e um conjunto de pessoas que partilham camas com mais espaço de movimentação interior que a primeira classe, mas condições dignas de uma terceira classe de um país do quarto mundo.

Quatro camas vermelhas, sem espaço para um homem de 1,73, duas recolhidas para dar espaço à pessoa de baixo se sentar sem pensar se bate com a cabeça na cama de cima; perto da janela, do outro lado de um corredor mais magro que uma rapariga anorética, dois aparentes assentos que se transformam em duas camas, uma superior e outra inferior. A viagem começa sem sobressaltos dignos de registo, apenas os que acontecem devido à trepidação do comboio. Uma conversa aqui, uma conversa acolá, um vídeo feito, promessas de fotos a tirar ao lar de idosos; um revisor que nos entrega um pequeno papel branco, primeiro sinal das burocracias da fronteira. Música começa a passar, espantados ficamos, conhecemos aquelas músicas pois parece que estamos num comboio, dito, ocidental com uma rádio, diga-se de passagem, ocidental. Partimos de noite, a noite irá ser a nossa fiel companheira, apesar da luz que invade a carruagem. Sento-me no meu banco, aprender russo parece ser um quebra-cabeças pior que o cubo de Rubik. Afinal, aquilo parece-se mesmo com o antigo alfabeto grego, mas pelos vistos lembraram-se de o adoptar de forma um pouco estranha. Admirado? Nem por isso, foram dois padres que o fizeram...

A noite corre silenciosa, o comboio desfila barulhento, a vida na carruagem começa a transformar-se lentamente. As primeiras camas são abertas, ao fundo o lar de idosos continua a falar alegremente e descobrimos o primeiro esquema soviético para nos tramar. Uma mulher olha continuamente para nós, silenciosa, olhos pequenos, abertos, sempre atenta. "KGB is still watching you", reza uma das inúmeras t-shirt's que se pode comprar em Moscovo. Às vezes é mesmo para ficar a pensar se não será verdade... Algumas paragens pelo meio, a carruagem começa a encher e os misteriosos acompanhantes começam a surgir. Uma velhinha muito simpática senta-se ao meu lado, rapidamente percebe que não percebo pévia de lituano, mas isso não a impede de estar sempre sorridente. O tempo passa, a noite desfila e a viagem parece que nunca mais termina. Letónia já está a ser deixada para trás, mais hora menos hora a fronteira chegará, e o terreno começa a ficar cada vez mais estranho.

Ida à carruagem onde supostamente se pode comer. Tenta-se treinar pela primeira vez o russo, tiro sai ao lado, fica patente a parvoíce da tentativa condenada ao fracasso desde o momento em que nem sequer se pensava em tentar. Uma boa conversa, boa companhia à frente, a empregada chega e diz que está quase a fechar. A dúvida instala-se, novamente coisas estranhas a acontecer, apenas se sabe que existe um papel à porta que diz que fecha às 00h e apenas eram 22h quase a bater as 23h. Outro aviso: devemos ir para o nosso lugar da carruagem. Olhamos pela janela, de facto o comboio está a parar aos poucos, mas nada indica fronteira passada. Finalmente o comboio pára e em menos de segundos contados nas suas várias dezenas, homens fardados começam a aparecer. Com apenas tempo para comer algo de forma rápida, recambiados somos para a nossa carruagem. O controlo fronteiriço letão entrou em força, vê passaportes, olhar arrogante e assustador, um dos homens carrega a tira-colo um notebook engraçado que apenas tem o monitor ligado porque tocar nele, até é mentira.

O comboio recomeça a marcha, a fronteira apenas está a... quiçá, uma hora de distância. Porque sim, são "apenas" 15 horas de comboio para percorrer quase 900km. Faz sentido? Nem tudo tem que fazer sentido, para quê? Não vale a pena, isto é bem mais interessante quando a maior parte das coisas não fazem sentido... Comboio pára, eis a fronteira. Primeiro contacto com as autoridades fronteiriças russas, do outro lado da janela apenas se consegue ver, no meio da escuridão cortada pelos candeeiros normais de uma estação soviética, portanto, poucos candeeiros, uns casebres amarelos. Dentro do comboio surgem caras fechadas, fitando-nos com um olhar inquisidor(especialmente a olhar para a foto do passaporte e depois para a cara da pessoa em questão... então se tiver algum sinal, ui ui...) e autoridade para meter medo. Levam os passaportes numa caixa de madeira e eis que surge mais uma razão para serem 15 horas. Espera-se, espera-se, pela devolução do passaporte e rezando para que nada estivesse mal ao ponto de sermos levados para alguma daquelas casinhas. Dezenas de minutos depois surgem os passaportes, um carimbo laranja ténue na folha número 2, e o nome da cidade - Pitalovo ou Пыталовский.

Parte mais interessante da viagem: acaba a fronteira, toca a dormitar. Horas assim se passam, apenas uma linha basta aqui. Aproximação a São Petersburgo, amanhece e a viagem interminável parece terminar. Pelo meio, a primeira visão da Rússia Interior, uma imensidão de planícies e planaltos, cobertos de branco e com parca população. Eis São Petersburgo, uma estação de comboios quaisquer. Toca a sair, toca a pisar solo russo, toca a tirar as primeiras fotos.

Eis a Rússia... ou melhor... Россия-матушка